Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 106
O som alegre de passarinhos foi o suficiente para arrancá-la de um sono profundo. Quando Seo-Ryeong abriu os olhos, raios de luz filtravam-se pelos fios desalinhados de seu cabelo.
“Ah…!”
Mas assim que despertou, um grito escapou de seus lábios. Uma dor estranha e intensa subiu de repente da região inferior do corpo. Suas pernas pareciam recém-operadas, sem força, e os olhos tão inchados que mal podia abri-los.
Quando tentou mover os lábios, as cordas vocais ardiam como se tivessem sido raspadas por um ancinho. Resumindo: seu corpo estava em completo desalinho. Ter passado por mais uma rodada de treinamento infernal e corrido sete quilômetros teria sido até mais fácil.
A febre ainda se fazia sentir, a respiração quente. Na noite anterior, Wooshin fora implacável, segurando-a e pressionando cada parte do seu corpo. Ele a havia explorado desde o peito até o umbigo, abrindo suas pernas para penetrá-la.
E quando ficava excitado novamente, não havia clemência: parecia querer estar conectado a ela, conhecendo cada centímetro de seu corpo como a palma da mão.
Seo-Ryeong enterrou o rosto no travesseiro, enquanto as lembranças da noite anterior passavam como flashes. Fora um dia longo.
Clip, clip, clip.
Hmm?
Clip, clip, clip.
O som a trouxe de volta à realidade.
O dorso bronzeado dele estava definido… e marcado por cicatrizes.
Seo-Ryeong ficou sem palavras. Lee Wooshin, sem camisa, estava sentado no fim da cama, rodeado pelas cobertas emaranhadas, cortando as unhas dos pés.
“–!”
Ao se sentar de repente, uma dor aguda percorreu suas costas. A cena matinal, antes tranquila, fez seu estômago revirar.
“Hã?”
Ao ouvir sua voz rouca, o pescoço forte dele se virou em sua direção, e ele sorriu, radiante.
“Dormiu bem?”
“….”
Seo-Ryeong achou a despreocupação dele irritante e permaneceu em silêncio.
O cabelo desalinhado caía sobre o nariz, e ele não usava roupa íntima, deixando vislumbrar os contornos do bumbum sob as cobertas.
Ainda assim, quando a luz do sol bateu sobre ele, sua visão clareou como se tivesse despertado de uma cegueira longa.
A sensação de luta e traição parecia uma memória distante. Estranhamente, ela se sentiu melhor. Apesar dos membros doloridos, seus olhos repousaram sobre Lee Wooshin, curvado sobre si.
“O que está fazendo, instrutor?”
Ela tentou afastar discretamente o tornozelo. Lee Wooshin pegou seu pé de volta.
“Aparando o que não é necessário.”
“…”
“Não tá com fome?”
“Sim, por causa de alguém. Mas, mais do que fome, estou toda dolorida.”
Os músculos da virilha pareciam rasgados, os mamilos ainda latejavam pela noite anterior, e sua entrada inchada ardia a cada respiração. Ela até riu, pensando que talvez o treinamento de tortura fosse mais fácil que isso. O som contínuo do cortador de unhas ecoava pelo quarto.
Ele pressionava firme suas unhas aparadas, eliminando qualquer rebarba, cuidando até dos pequenos pedaços de pele soltos. Depois de fazê-la sentar, deitar e levantar sem piedade, por que agora ele agia tão gentilmente? Seo-Ryeong passou as mãos pelo rosto como se se lavasse.
“Instrutor…”
Na noite passada, um pensamento rápido a fez imaginar que Kim Hyeon poderia ser estrangeiro. Mas como alguém de fora poderia se tornar agente do Serviço Nacional de Inteligência? Só pelo tamanho, parecia improvável que fosse local, mas ela sacudiu a cabeça em resignação.
“Qual é a sua nacionalidade?”
Uma risada súbita ecoou.
“Finalmente se interessando por mim?”
“…!”
“Depois de passarmos a noite juntos, agora quer saber de que sangue é este rosto?”
“Não era esse tipo de interesse que eu….”
“Depois de enlouquecermos juntos, quer que eu me apresente?”
“….”
“Como você é atrevida.” O sorriso dele, sempre presente, a interrompeu. “Meu avô era russo.”
Levantando-se levemente, Lee Wooshin continuou a brincar com seus dedos dos pés, sem desviar o olhar. Sua voz era neutra, sem emoção.
“Rússia? Então não é de um país de língua inglesa? Que inesperado.” Seo-Ryeong observava seu cabelo negro e brilhante e seus traços definidos. Sem perceber, disse: “Interessante… Quase fui pra Rússia uma vez.”
“…”
Ela piscou, as palavras saindo em turbilhão.
“Fiz ginástica na escola. Na época, enviavam os melhores alunos pra Rússia para treinamento intensivo. Você fala russo? Até aprendi o alfabeto cirílico.”
“E você foi pra lá?”
“Não. Desisti da ginástica e da escola antes de ir.”
“Seu marido sabe disso?”
“Sabe o quê?”
“Que houve um tempo da sua vida que você está tão ansiosa para contar.”
“…!”
Percebeu que soara como se estivesse se gabando? Ela fez cara de curta. A ginástica era algo que ela era boa, mas não amava.
“Por que não contou ao seu marido?”
Ele parecia genuinamente curioso, acariciando levemente seu pé. A sensação causou um arrepio estranho no peito.
Seo-Ryeong puxou a coberta até o pescoço, estranhamente exposta apesar de falar tão abertamente.
“Tinha medo de dizer algo errado. Queria mostrar só meus melhores lados. Se começasse a falar pequenas coisas, ele descobriria que larguei a ginástica, que não tinha amigos, que minha personalidade não era boa. Tive medo de mostrar meu verdadeiro eu.”
“…”
“Então não falava muito. Acho que era só… desesperada.”
O olhar dela se perdeu no teto.
“Desesperada.”
Sua voz era calma, quase distante. Lee Wooshin a observava, imóvel, mas um ligeiro tremor passava por seus olhos, sem que parecesse notar.
“Instrutor, você não sabe como é isso, não é?”
Ela lançou a pergunta casualmente. Ele não poderia entender o que é engolir sentimentos por medo de ser rejeitada. Sempre a olhara como ingênua.
O constrangimento de se expor bateu atrasado. Ela coçou a testa e enfiou os pés sob a coberta.
O silêncio se alongou, carregado de tensão. Seoryeong sorriu de repente, mostrando os dentes.
“Mas até você deve ter tido ao menos um pior momento, certo?”
“…!”
“Para mim, foi ontem, e você me viu assim.”
Ela se sentia completamente vulnerável. O corpo de Kim Hyeon parecia inerte, e isso a incomodava, pois expunha seu lado mais fraco para Lee Wooshin.
O olhar intenso dele a atravessava. Ela puxou a coberta sobre as marcas vermelhas no peito, quadris e coxas.
“Odeio ser a única a mostrar fraqueza. Então chega de unhas. Agora você compartilha algo também.”
Ela acreditava que só assim a relação poderia continuar equilibrada.
Lee Wooshin se virou completamente, sorrindo como se estivesse se divertindo.
“Ah… então quer dizer que depois de dormir com o instrutor, você tá desconfortável, envergonhada de ontem, e pra equilibrar, quer arrancar algo de mim. Acertei?”
O tom dele era sarcástico, afiado.
Seo-Ryeong estremeceu, mas sabia que negar só pioraria as coisas.
“Sim”, murmurou, evitando o olhar dele.
Ele riu, puxou seu pé da coberta e começou a mordiscá-lo.
“O que tá fazendo?!”
“Como alguém com personalidade tão torta pode ser tão adorável?”
“…!”
“Não quer ver seus dedos tortos arrumados de novo?”
“Tira a boca do meu pé!”
O contato da boca dele fez Seo-Ryeong gritar. Ele brincava, como se segurasse o pé de um bebê.
Seu pulso pulsava contra a sola do pé.
Por que ele estava rindo assim? O olhar caloroso e gentil a deixava corada. Ele era frio quando silencioso, mas o sorriso suave a desconcertava de um jeito que não conseguia suportar.
“E agora, como devo me sentir?”
Apoiando-se numa mão, Lee Wooshin se alongou preguiçosamente.
“Quase todo momento da minha vida foi o pior.” Dobrou os dedos um a um enquanto falava, de modo leve e despreocupado. “Quando eu tinha oito anos, meus pais morreram. Aos catorze, fiquei totalmente sozinho. Assim que virei adulto, as pessoas em quem confiava me traíram antes de morrer. Qual você quer ouvir? Vá em frente, agente Han Seo-Ryeong, escolha uma.”
“….”
“Todos são horríveis, então qualquer escolha vai ser divertida.”
Com expressão vazia, coçou a nuca. Falava como se folheasse um show de talentos da infância, quase brincando.
“Mas já que pediu só um…”
De repente, baixou o olhar.
“O pior dia também foi o melhor.”
Para alguém como ele ter um “melhor dia”…
“Qual foi?”
A pergunta escapou antes que pudesse se conter. Ela piscou, arrependida. Ele coçou o maxilar, levemente perturbado.
Ele falava livremente sobre morte e traição, mas algo dizia que guardaria segredo sobre isso. O instinto estava certo. O olhar profundo dele a prendia.
“Meu dia de casamento.”
O toque do telefone dele cortou o momento, como um choque gelado, despertando-os dos pensamentos.