Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 138
“Seo-Ryeong vai ficar bem daqui pra frente.”
Deixando a vice-diretora Joo Seolheon em silêncio, Lee Wooshin desligou primeiro. O último relatório entre eles terminou em uma atmosfera seca e desconfortável.
Desde o dia em que ela descobriu um fragmento da “Caixa de Pássaros”, suas palavras haviam diminuído visivelmente.
Wooshin jogou o celular de lado e apoiou a cabeça na cabeceira da cama. O rosto, exausto e sem cor, parecia pálido, e seus olhos cansados não tinham vida alguma.
Ele havia deixado os documentos com a assinatura da “Coruja” no segundo escritório da vice-diretora Joo. Depois, aparecera diante dos agentes que fingiram ser transferidos para outro hospital para uma segunda cirurgia. Para manipular as imagens das câmeras de segurança e os horários do hospital, ele deliberadamente deu uma volta pelo parque.
Depois disso, arrancou o couro que cobria as cicatrizes ainda em cicatrização — suas mãos, pés e costas ainda guardavam vestígios de feridas antigas.
Durante as três semanas em que esteve fora da Coreia, o codinome “Macka” teve sua demissão aprovada, Coruja estava em segurança, e Kim Hyeon havia recebido uma despedida inesperada.
“Acabou. Finalmente…”
Coruja havia desistido de Kim Hyeon. Ainda assim, as palavras “vamos terminar” nunca foram ditas. Eles haviam dito “eu te amo” tantas vezes, mas, diante dessa simples mentira, hesitaram.
Ele achava que já estava imune a esse tipo de declaração, mas, estranhamente, seus lábios pareciam de chumbo.
“…”
Eles haviam dito que eram gratos. Haviam dito que foram felizes.
Ao se lembrar daquele momento, todo o seu corpo se contraiu novamente. Com uma expressão mais terna do que nunca, como a de uma esposa, ela havia pronunciado aquelas palavras…
Ele sabia como desviar de balas, mas não sabia como permanecer impassível diante da confissão de sua mulher. Sentia como se o peito afundasse, derretendo por dentro.
Desde então, ele mergulhara em um abismo sem fim. Nem ele mesmo conseguia entender em que estado estava.
Talvez tivesse sentido algo parecido durante o tempo em que ficou detido em silêncio em um centro privado de reclusão no Camboja, após a operação Caixa de Pássaros. Imóvel e mudo, ele apenas fitava o teto.
“――”
Era possível se sentir tão esvaziado assim? Uma tigela de arroz intocada endurecia sobre a mesa, enquanto uma sede insaciável arranhava sua garganta.
Ele havia amado a Coruja mais do que tudo… e agora, parecia mesmo que tinham terminado. Por mais que bebesse água, nada conseguia aliviar o gosto seco na boca.
O momento em que Kim Hyeon mencionou “um novo homem” fez uma sirene soar em sua mente. Mas quando percebeu que fora ele mesmo quem empurrou Kim Hyeon para longe, algo feroz despertou — uma possessividade que o impedia de suportar a ideia de alguém mais ocupando seu lugar.
“…Ha.”
Lee Wooshin passou a mão pesada sobre o rosto quente.
Joo Seolheon estava enganada. Os temores da vice-diretora jamais se concretizariam. Seo-Ryeong não voltaria a se envolver em atos perigosos. Por mais que Rigay tentasse seduzi-la, ela não se deixaria abalar.
Dessa vez, de verdade… ele queria viver com ela como ele mesmo. Queria se estabelecer ali, por muito, muito tempo, apenas para perseguir um sonho comum.
E com esse pensamento, Lee Wooshin adormeceu.
“――!”
Acordando de uma paralisia do sono, ele se viu diante de uma enfermeira que o encarava com expressão severa, concentrada em seu pé. No instante em que seus olhares se cruzaram, a mulher — que terminava de enrolar a faixa — franziu o cenho ainda mais.
“Senhor Lee Wooshin! O senhor não devia estar em outro hospital para a cirurgia? Por que seu pé está nesse estado? Os pontos estão todos abertos e a ferida está infeccionada! O senhor andou por aí sem muletas, não foi?”
“…”
Respirando com dificuldade e sem responder, ele observou a enfermeira gritar de frustração.
“Não foi pra isso que mandamos o senhor pra outro hospital!”
Apesar da bronca, ela amarrou a última faixa com cuidado e precisão.
O suor frio em seu pescoço escorria — que tipo de sonho ele acabara de ter? Wooshin levou a mão à têmpora latejante, tentando estabilizar a visão trêmula.
As lentes fornecidas pelo Instituto de Pesquisa de Defesa nunca haviam incomodado antes, mas agora pareciam ter escorregado por trás de seus globos oculares, causando uma sensação insuportável.
“Pelo menos o resultado do seu exame ósseo foi bom. Então, por favor, cuide-se!”
Algo estava errado — profundamente errado. Assim que a enfermeira saiu, o celular vibrou. Quem ele tinha visto naquele sonho? Alguém chorava. Alguém estava em meio às chamas…
Wooshin apertou o aparelho com força, o rosto tenso como pedra.
“Se essa ligação for pra dizer besteira, Wonchang, você tá morto.”
“Chefe, a Coruja roubou um carro da polícia!”
“O quê?”
O rosto dele se contorceu imediatamente. Tinha encerrado tudo há apenas algumas horas, certo de que não haveria mais problemas. Wooshin puxou a gola do avental hospitalar, pronto pra arrancá-lo e sair.
“Mas ela dirigiu até o Hospital Sehwa!”
“…”
“Acho que ela só queria te ver. De qualquer forma, já controlamos a situação.”
“…Ha.”
Um suspiro pesado escapou. O pesadelo incômodo se apagou no fundo da mente, substituído pelo peso das três sílabas que formavam o nome dela — Coruja.
Mas… roubar um carro da polícia? Onde diabos ela estava com a cabeça?
Andando em círculos pelo quarto, ele fixou o olhar na porta, esperando que se abrisse. No instante em que ela voltasse, a puxaria para seus braços, desesperado para recuperar o tempo perdido.
Agora que ela estava de volta, não a deixaria escapar nunca mais.
“Vai dar tudo certo. Não… eu vou garantir que dê.”
Nunca mais a deixaria esperando sozinha.
Mas seus nervos estavam à flor da pele, impossibilitando qualquer descanso. Wooshin alcançou a cadeira de rodas, repetindo o pensamento como um mantra.
Seo-Ryeong, vai dar tudo certo agora. De verdade.
Seo-Ryeong despiu-se, deixando as roupas caírem uma a uma no chão antes de entrar no banheiro.
A água caía com força, encharcando o corpo coberto de hematomas. Se ela não quebrasse o estado de choque estampado em seu rosto, ele perceberia imediatamente. Ele era esperto demais para não notar.
Seus dedos estavam rígidos, quase congelados, o corpo sem calor. Era como se arrastasse um sistema nervoso quebrado. Ela deu dois tapas fortes no próprio rosto — um, dois.
A pele úmida ficou vermelha e inchada quase instantaneamente. Ainda assim, ela apenas ficou ali, encarando o fluxo de água que descia em cascata.
“…”
Aquilo… podia mesmo ser real?
De qualquer ângulo que olhasse, os dois eram completamente diferentes. Voz, corpo, aparência — nada batia.
Lee Wooshin era mestiço, um quarto coreano; Kim Hyeon era coreano puro. Kim Hyeon tinha pelos no corpo, Wooshin era completamente liso, quase como se tivesse alopecia congênita. Kim Hyeon era gentil. Wooshin, impiedoso.
Ela simplesmente não conseguia acreditar. Se recusava a acreditar.
“Como… como eles podem ser a mesma pessoa?”
A água feria seus olhos como agulhas, mas ela não desviou. Como podiam ser a mesma pessoa?
Era absurdo.
Kim Hyeon fora o primeiro a ensiná-la a amar. Agora, também a ensinava o que era partir o coração.
Se ele tivesse sido Wooshin o tempo todo…
Se o instrutor — seu cúmplice, seu parceiro — tivesse sido, desde o começo, o marido que desaparecera sem deixar rastros…
“…Ah-”
Seoryeong apoiou-se nos azulejos e desabou no chão.
A água castigava seus ombros frágeis, como se a condenasse. Encolhida como um inseto, tremia incontrolavelmente.
Teria sido tudo planejado? O interesse que ele demonstrou, os beijos, as noites juntos… tudo encenação?
Teria “Lee Wooshin” sido apenas mais uma identidade fabricada?
Quanto mais pensava, mais difícil era respirar. A dúvida crescia como uma avalanche, esmagando-a. Parecia que seu peito ia se partir.
“E se dormirmos juntos e você acabar sentindo o mesmo que sentia com seu marido? Isso me tornaria ele também? Olhe bem. Esse é o rosto do homem que você arriscou tudo pra encontrar?”
“Achei que você fosse mais esperta, mas por que está tão ingênua agora? Acha mesmo que dormir com outro homem te daria a resposta? Que vai reconhecer só pelo toque, porque o ama?”
Cada palavra dele voltava à sua mente como ondas quebrando com violência.
“Acorde. Sexo é a coisa mais fácil de fingir.”
“Você fez isso com seu marido. Devia saber disso.”
“Mesmo depois de tudo, ainda acredita que o amor pode tudo. Essa confiança cega é o que te leva a errar. No fim, ela te impede de enxergar a verdade.”
“Ugh!”
Seo-Ryeong afastou os fios de cabelo molhado grudados na pele e desabou, pressionando o rosto contra o piso frio.
“Cof! Ah!”
Seu estômago se revirou, e ela vomitou. O corpo curvado, a garganta contraindo em espasmos. O frio do chão infiltrava-se em suas pernas.
“Eu vou te ajudar a encontrar seu marido. Eu te ajudo.”
Era esse o preço por abrir os olhos? Cada pesadelo levava a outro, ainda pior.
Ela havia encontrado Kim Hyeon, apenas para perder Lee Wooshin.
Uma troca cruel.
Quando chegou ao quarto dele, já era noite.
O rastreador que ela colocara em Kim Hyeon permanecera o dia inteiro no Hospital Sehwa — até parar no depósito de incineração de resíduos médicos.
Subindo até o quarto vazio de Wooshin, vasculhou gavetas e armários. Poeira cobria a janela e a mesa, como se ninguém tivesse entrado ali há dias.
De volta à cama, pressionou o rosto contra o travesseiro — e então recuou. O cheiro era diferente. Inquieta, arremessou o travesseiro longe. Algo fervia dentro dela, quente, denso, prestes a explodir.
Arrancou as roupas e voltou ao banheiro.
A água correu por longos minutos antes que ela saísse, nua.
Cobriu-se apenas com um lençol fino e sentou-se no chão, pingando em silêncio.
Logo depois — click. A porta se abriu, e o som das rodas de uma cadeira ecoou.
“Você…!”
Wooshin se levantou num pulo, caminhando rápido até ela.
“Seu celular estava desligado e você sumiu. Onde diabos estava?”
“Onde você estava, Instrutor?”
“…”
“Eu disse pra você esperar.”
Ele soltou um suspiro e passou a mão pelos cabelos.
“Por que tá vestida assim? Tá frio.”
“Fui pra casa me lavar. No caminho de volta, pensei em comprar flores, mas…” a voz dela se perdeu num murmúrio.
O lençol escorregou do corpo dela, e, num gesto súbito, Seo-Ryeong o puxou para perto.
Ele congelou.
Seo-Ryeong o beijou com força.
“Han Se-!”
Sua língua invadiu a boca dele como uma lâmina. O toque dos corpos fez um arrepio subir pela espinha dela.
Cadáveres frios, carne rasgada — imagens lampejaram em sua mente. O cheiro ácido de corpos queimando, o peso de abraçar os mortos, soluçando… tudo pulsava em sua língua trêmula.
Carne macia, rostos que desabavam ao toque… mesmo assim, ele permaneceu ao lado dela.
A língua de Seo-Ryeong se moveu com urgência, dominando a dele, encharcando-o com seu calor.
“Haa…”
Ela sugou sua língua, mordendo. O gosto amargo e queimado se espalhou. Era dor? Nojo? Tristeza?
Wooshin abriu os lábios como se já esperasse por aquilo. No fim, era essa doçura — essa bondade — o verdadeiro veneno.
Lee Wooshin, então sofra do mesmo jeito.
Os olhos dela brilharam friamente.