Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 147
Desde os três anos, ela limpava chaminés, porque seu corpo pequeno conseguia se enfiar nelas com facilidade. Durante o dia, trabalhava nas vastas plantações de sorgo de Sakhalin, e à noite, apanhava.
Depois de ser chicoteada até o amanhecer, precisava dormir pendurada no ar, como um peixe congelado balançando num varal.
O líder do culto os deixava pendurados como roupas, alegando que era assim que o Império Britânico abrigava os sem-teto.
Mesmo dormindo, às vezes as cordas arrebentavam, e as crianças mais velhas caíam, quebrando os tornozelos.
“Nunca baixe a guarda.”
Essa era a única coisa que o líder exigia.
Ela nunca chegou a ver o rosto dos pais. O único “pai” que conhecia era o líder do culto. O sono e a comida eram rigidamente controlados. Sem trabalho, não havia alimento; sem castigos, não havia amor. Os “pais” que conheciam eram sempre tiranos.
“O Senhor estabelecerá um reino eterno, e esta Sakhalin é a terra prometida do paraíso! O Grande Castelo do Inverno esmagará todas as nações do mundo e reinará sozinho para sempre!”
Nos intervalos, eles se sentavam em fileiras nas cadeiras do mosteiro, aprendendo palavras e escrituras com os sacerdotes. Os professores, com o rosto vermelho de fervor, faziam-nos recitar versículos. Eles gritavam de volta, com vozes desajeitadas, mas fortes.
Mas as crianças mais velhas sussurravam que o líder do culto os vendia para o exército. Mais de uma vez viram homens fardados saindo de carros enquanto o líder, descalço, corria para cumprimentá-los, curvando-se profundamente.
“Não! Sakhalin é a terra prometida! Eles devem ter vindo para garantir essa promessa!”
Alguém, de olhos arregalados como os de um linguado, gritou, e um murmúrio de espanto percorreu o grupo. Todos desejavam que alguém viesse tirá-los dali. De repente, o choro incontido encheu o ar.
“Não existem anjos neste mundo.”
No meio de tudo isso, apenas a pequena Sonya corria de um lado para o outro, ofegante. Suas mãos miúdas seguravam uma foice quase do tamanho do corpo enquanto ela cortava as hastes de sorgo.
Depois, ainda precisava juntar as folhas cortadas e amarrá-las até o pôr do sol, mas o crepúsculo já havia caído. Naquele dia, provavelmente, foi atingida na canela direita.
“A Sonya nunca chora. É esquisito.”
Os outros sempre achavam estranho. Mas chorar só fazia a sede e a fome aumentarem. Então, mesmo quando as crianças mais velhas choramingavam de dor, Sonya apenas suportava em silêncio.
Quando cerrava o maxilar e engolia teimosamente o choro, mãos ásperas seguravam as suas. O único que a compreendia era Kia, um garoto ainda menor do que ela.
“Sonya, Sonya… então olha eu chorar.”
Ver Kia chorando, com o nariz escorrendo, de alguma forma aliviava Sonya. Ele chorava alto por ela todas as vezes.
Mesmo depois de derramar lágrimas de galinha — rápidas, curtas —, se o rosto de Sonya amolecia, Kia de repente sorria, exibindo uma habilidade teatral impecável.
Sonya dividia de bom grado sua água e comida com ele. Então Kia piscava, confuso, antes de se enfiar em seus braços e desabar em lágrimas.
Eram iguais em tudo. O cabelo comprido e despenteado fazia com que se parecessem — tanto em gênero quanto em aparência.
Corriam com a mesma rapidez, nunca escorregavam das cordas em que dormiam pendurados. Eram fortes cortando o sorgo, flexíveis o suficiente para rolar e cair sem se ferirem.
Com o tempo, cada vez mais lugares começaram a requisitar as crianças de Sakhalin. Sempre que isso acontecia, o líder do culto vestia seu manto vermelho, quase nunca usado, como se estivesse apresentando mercadorias preciosas. As crianças eram despidas e jogadas em arenas desconhecidas.
—!
Num piscar de olhos, sangue espirrou no rosto dela. Quando as barrigas dos irmãos com quem crescera foram rasgadas e as vísceras se espalharam, Sonya instintivamente agarrou a mão de Kia.
Os homens de olhos azuis gargalhavam, batiam palmas e gritavam, mas as crianças permaneceram imóveis, petrificadas.
“GRAAAAH—!”
Um urso, de boca escancarada, rugiu de forma aterrorizante. Quando o monstro avançou em quatro patas, exibindo as presas, Sonya puxou Kia para trás, justo quando o menino se urinava de medo.
“Kia, sobe!”
Antes que o animal de uma tonelada os atingisse, os dois escalaram as barras de ferro a tempo. Suas mãos trêmulas se apertaram com força. O bicho era maior e mais feroz do que o próprio líder do culto, e seus corações pareciam prestes a explodir.
O urso ergueu-se sobre as patas traseiras e sacudiu as grades com violência, mas eles se agarraram com todas as forças. De vez em quando, apitos da plateia tilintavam no chão como latas caindo.
Pela primeira vez, eles queriam viver.
Perderam a conta de quantas vezes enganaram a morte enquanto viajavam por regiões sem nome.
Lutaram desarmados contra crianças criadas com ursos no Daguestão. Aprenderam acrobacias e a andar na corda bamba. Rastejaram, rolaram, voaram. Onde quer que estivessem, faziam o que era preciso.
Mesmo entre chamas rugindo, os dois nunca soltaram as mãos. Aquilo era a única linha que os mantinha vivos.
No ar, estendiam-se um ao outro. Quando um caía, o outro agarrava seu tornozelo. A multidão explodia em aplausos quando giravam no trapézio e se abraçavam como um só corpo.
A pele ardia vermelha no calor do fogo, mas eles riam. Alguns irmãos morriam nas arenas, dilacerados por feras enlouquecidas por afrodisíacos. Outros eram cortados em pedaços durante acrobacias sobre lâminas afiadas.
E mesmo assim, o público… achava divertido.
Um dia, diziam, o Grande Castelo do Inverno destruiria todas as nações do mundo. Mas Sonya prometeu arrancar os olhos dos que aplaudiam e enfiar lanças em seus corações.
“O Circo Noturno.”
O líder do culto chamava aquele espetáculo bárbaro de uma antiga tradição de Sakhalin.
A maioria dos espectadores eram nobres russos, e o líder estreitava laços com eles. Para os coreanos, ele era um deus; diante da elite russa, virava um palhaço submisso.
“Esses dois servirão.”
Muitos irmãos já tinham morrido, mas Kia e Sonya eram o par mais popular.
Mais tarde, alguns homens ricos apareceram para escolher crianças. Kia e Sonya pareciam quase idênticos — mesma altura, mesmo cabelo comprido. Os homens limparam Kia e a levaram para uma mansão sombria, subterrânea.
No instante em que um homem gordo e nu estendeu a mão para Sonya, Kia perdeu o controle. Quebrou um cinzeiro no chão e enfiou o caco no olho do porco.
“—!”
Mesmo esmagado sob o peso do homem, Kia não desistiu; esfaqueou-lhe a garganta com fúria até o corpo cair imóvel, boiando numa poça de sangue.
“Seus demônios! Vocês arruinaram tudo!”
O líder do culto espancou Kia quase até a morte, mas dessa vez, não avançou contra ele como antes.
Eles eram como cães miseráveis, pregados a tábuas, incapazes de latir ou fugir.
Ainda assim, sobreviveram — apenas para serem enviados ao Castelo do Inverno. Antes da partida, o líder prometeu que o sofrimento acabaria e que o paraíso os aguardava.
O belo Castelo do Inverno… parecia impossível, mas quando o viram, suas bocas se abriram em espanto. Atordoada, Sonya apertou a mão de Kia como se selasse um pacto.
Escadarias cor de mel, móveis incrustados de pedras preciosas. Um lustre deslumbrante florescia no teto, e o papel de parede dourado brilhava mesmo na penumbra. O carpete vermelho e macio acolhia seus pés congelados.
“Kia! Será que a gente…?”
Depois de tanto sofrimento, será que enfim haviam chegado ao paraíso? Mas antes que terminasse a frase, uma mão enorme e áspera os empurrou para dentro de um quarto. A ilusão desfez-se num instante.
“O Castelo do Inverno é o teste final para herdar o espírito da antiga KGB. Todos vocês se destacaram no treinamento e conquistaram o direito de servir à Pátria.”
Toc, toc. Passos de botas ecoaram, e a porta se abriu. Homens russos, altos e imponentes, entraram com passos firmes. A aura deles era inconfundível. Kia puxou Sonya para perto.
“Superem esta prova final e tornem-se agentes orgulhosos, que contribuirão para a nação.”
O Castelo do Inverno, cercado por uma neve sem fim, branca e silenciosa.
“O que vocês devem abandonar agora… é a compaixão.”
Todo o sofrimento deles, soterrado sob camadas de neve.
“Apenas aqueles que matarem a criança diante de si podem se tornar verdadeiros agentes russos.”
Uma mansão silenciosa e bela.
“Comecem.”
O teste final para forjar agentes russos era feito com manequins vivos.
Eles eram apenas oferendas.
Esse era o destino das crianças de Sakhalin.