Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 155
Depois de voltar à Coreia, Joo Seolheon manipulou os resultados dos testes antes de enviá-los aos Estados Unidos, para impedir que Sonya fosse levada embora.
Era verdade que cérebros mais jovens eram mais suscetíveis à sugestão; mesmo em um novo ambiente, Sonya permanecia apática, o olhar disperso, a mente longe.
Enquanto isso, Joo Seolheon começou a tratar os ferimentos físicos de Sonya. Cuidou das cicatrizes antigas no corpo da menina de dez anos, dos dentes apodrecidos e dos ossos desalinhados de fraturas nunca tratadas.
Damon ordenou que ela enviasse Sonya para um orfanato, e não para uma família comum.
“Se você pretende usá-la como agente no futuro, uma órfã sem raízes será muito mais útil.”
Joo Seolheon avaliou meticulosamente orfanatos por todo o país até finalmente enviar Sonya para um orfanato decadente administrado pelos irmãos que ela própria abandonara anos atrás. Havia instituições muito melhores, mas ela não tinha uma razão clara para escolher aquela.
Ela precisava subir até o topo. Não sabia quando nem como Damon poderia exigir Sonya de volta sob o pretexto da Operação Véu Vermelho, então cada dia era como caminhar sobre gelo fino.
Além disso, manter vigilância constante sobre Sonya exigia um orçamento considerável. Joo Seolheon usou suas conexões nos Estados Unidos para garantir promoções rápidas, acumulando conquistas de forma implacável.
Somente ao alcançar o mais alto cargo teria autoridade para planejar operações confidenciais e distribuir recursos.
Com o tempo, Sonya, como se despertasse de uma longa hibernação, recuperou a clareza e se adaptou ao novo ambiente.
Sob o disfarce de uma patrocinadora, Joo Seolheon recebia relatórios periódicos. Naquela noite, ela bebia novamente — vodca russa.
“O quê? Trancaram ela num depósito por três dias, sem comida?”
“Bem… a criança atacou os meninos mais velhos do orfanato sem piedade…”
“Sem piedade? O que uma criança pode fazer de tão terrível assim?!”
“Um garoto quebrou o braço, outro teve a pélvis tão lesionada que mal consegue andar. Alguns foram estrangulados, outros acabaram com costelas fraturadas.”
“…”
Joo Seolheon pressionou os dedos contra a testa e soltou um longo suspiro. Só então se lembrou dos horrores que Sonya devia ter enfrentado para sobreviver no Castelo de Inverno — as provas finais, indescritíveis.
Nas noites em que os jovens recrutas visitavam o anexo, ela e Rigay passavam em claro. Engoliu a vodca de uma só vez, o líquido queimando sua garganta.
“E não é como se a gente a deixasse passar fome. Às vezes, a Seo-Ryeong se comporta de forma estranha. Recusa comida, ou bate em si mesma. Mesmo quando tentamos vestir as roupas bonitas que você manda, ela insiste em usar as rasgadas.”
“…”
‘Rigay, por mais que você tenha enterrado as lembranças de infância dela… será que conseguiu apagar completamente as marcas de Sakhalin daquela criança?’
Ela dera à menina o sobrenome da mãe que odiava. Seo-Ryeong, escrita com os ideogramas de “brilhante” e “luz do sol”, mas a garota ainda se trancava em depósitos escuros.
‘O que eu faço, Rigay? Não confio em mim mesma pra lidar com isso sozinha.’
O estômago se revirava. Sonya ainda era anormalmente ágil, mal sentia dor e raramente demonstrava emoções. Quando a equipe do orfanato expressou preocupação com o temperamento dela, Joo Seolheon providenciou imediatamente sessões de terapia.
No fim, foi uma bênção — ela já queria que Sonya tivesse ao menos um adulto gentil e acolhedor ao redor.
Exausta após o trabalho, Joo Seolheon assistiu novamente ao vídeo mais recente de Sonya.
“Eu gosto do que é meu. Quando eu crescer e tiver algo realmente precioso, vou dar tudo de mim. Vou cuidar muito bem. Vou valorizar de verdade.”
“Que boa menina.”
A voz do psiquiatra era suave. Que boa menina. Joo Seolheon repetiu as palavras mentalmente. Que boa menina.
Sem perceber, sorriu, observando o rostinho da criança, agora mais cheio e redondo. Instintivamente, tocou o próprio peito flácido.
Parecia um sonho distante o tempo em que dali fluía leite com tanta facilidade. Agora, não passavam de formas inúteis.
Enquanto observava os olhos vivos e brilhantes de Sonya, fumou até o amanhecer. O apartamento amplo parecia frio, vazio. Ela não conseguia parar de pensar naquele homem miserável.
Mesmo depois de voltar da Rússia, manteve um hábito: registrar à mão cada estágio do crescimento de Sonya. Mas raramente assistia às competições de ginástica da menina.
“Expulsão?!”
“É que…”
“Os outros pais têm influência no meio esportivo. A filha deles já era uma estrela em ascensão, mas a Seo-Ryeong quebrou a perna dela durante o treino, e a relação entre as duas famílias já era tensa.”
“Ha! Influência? Você sabe com quem está falando?!”
A raiva subiu, irracional. Ela mesma sabia que estava exagerando, mas a emoção era forte demais.
“O pior é que a Seo-Ryeong não faz nada pra se defender. Nem tenta limpar o próprio nome.”
O problema crônico de Sonya era sua incapacidade de criar vínculos.
Mas Joo Seolheon não podia simplesmente aparecer e se revelar. Não podia dar a menor pista sobre as origens da menina. Adicionar esse peso à vida dela seria impensável.
No fim, Joo Seolheon descontou a raiva denunciando os outros pais à Receita Federal, garantindo que suas fortunas ilegais fossem confiscadas.
Considerando que o atual diretor da SNI tinha mais de setenta anos, a ascensão de Joo Seolheon ao cargo de vice-diretora aos cinquenta foi meteórica. Enquanto isso, Sonya conseguiu certificados, um emprego e parecia levar uma vida estável.
Então, Damon — agora vice-diretor da CIA — entrou em contato com uma notícia devastadora: a Rússia havia libertado Rigay.
“Quero Sonya de volta.”
Essas palavras abalaram Joo Seolheon até o âmago.
“…!”
O medo que carregara por toda a vida finalmente havia se materializado.
“Pretendemos capturar Rigay vivo e recuperar sua pesquisa. Ter a filha dele em nossas mãos seria a alavanca perfeita para fazê-lo falar.”
‘Tenho que matar Rigay antes que o capturem.’ — foi a única coisa que conseguiu pensar.
Tempo demais havia se passado para que promessas ainda valessem. Rigay sumira sob a rígida vigilância russa, e no fundo, sempre fora um covarde. Ela já não podia ter certeza de nada.
“Zoya, use Sonya para capturar Rigay.”
Embora Joo Seolheon tenha planejado a Operação Caixa de Pássaros com total apoio da CIA, ela agiu em completa oposição aos interesses americanos.
Diferente dos EUA, que queriam Rigay vivo, Joo Seolheon pretendia matá-lo.
‘Rigay e Sonya nunca podem se encontrar. A hipnose que ele fez nela jamais pode ser desfeita.’
Sonya precisava de alguém que a protegesse. Num mundo onde nem Rússia nem América eram confiáveis, precisava de alguém capaz de abrigá-la sob o disfarce de uma operação.
E esse alguém tinha que ser alguém em quem Sonya jamais desconfiaria.
Só havia uma pessoa que se encaixava nessa descrição… um marido amoroso.
“Você é o próximo alvo. Codinome temporário: Coruja.”
Um pássaro belo, de grandes olhos, que corta a escuridão. Nenhum outro nome parecia mais adequado.
“Você também faz bolinhos de arroz?”
Lee Wooshin. O único herdeiro da família Solzhenitsyn.
Depois de vagar por zonas de guerra no exterior, o rapaz se alistou no exército coreano assim que atingiu a maioridade. Foi então que Joo Seolheon recrutou o jovem dilacerado para a SNI.
Ela tinha incontáveis agentes sem nome sob seu comando, mas Lee Wooshin era o melhor entre todos.
No início, ele não passava de uma moeda de troca.
Se um dia eu for forçada a perder Sonya, entregarei o herdeiro desaparecido dos Solzhenitsyn. Esse era o papel que ela lhe atribuía.
A herança deixada por Maxim Solzhenitsyn era incalculável, e o governo russo ainda buscava o herdeiro para recuperar as contas secretas na Suíça.
Ao menos, isso lhe garantiria um assento à mesa de negociações. E, ao pensar em Ivan e Yani — que haviam arriscado tudo pelas crianças de Sakhalin — Joo Seolheon acreditava que Lee Wooshin era alguém capaz de olhar para Sonya sem preconceitos.
O que ele queria eram os registros finais do Castelo de Inverno — e o rosto e o nome de uma criança.
Um riso amargo escapou de seus lábios. Como ele acabou se tornando minha peça? — Joo Seolheon acendeu um cigarro.
Que expressão é essa?
Ela encarou a foto por um longo tempo. Aquela era realmente Sonya, sorrindo com todos os dentes à mostra?
Era a primeira vez que via aquele sorriso desde o casamento dos dois.
“…”
Foi só então que Joo Seolheon percebeu: a menina que um dia pendia no ar como um fantoche finalmente estava feliz.
‘Que boa menina.’
Silenciosamente, repetiu as palavras que um dia havia sussurrado.
“Rigay, você devia ter visto como os olhos dela se curvavam como arco-íris.”
Rigay havia tentado suicídio.
“Acalme-se. Viktor Rigay está enfrentando questões pessoais agora,” informou Damon.
Seria isso sorte? A vigilância da CIA sobre Rigay — e sobre Sonya — diminuiu visivelmente.
E isso se tornou a desculpa perfeita, porque o oftalmologista de Sonya havia feito um alerta inesperado:
“Se isso continuar, ela pode realmente perder a visão.”
A operação precisou ser interrompida.
Por mais avançada que fosse a tecnologia do Instituto de Pesquisas de Defesa, os olhos de Sonya estavam chegando ao limite.
Eles não podiam cegá-la de verdade. De repente, Joo Seolheon se lembrou da agulha que um dia falhara ao tentar implantar sugestões em um cérebro adulto. Um arrepio percorreu sua espinha.
Era hora de decidir.
Rigay confiara mais em um deus invisível do que em Zoya, que estava bem diante dele — devoto, fanático, surdo à razão.
O deus de Han Seo-Ryeong era Kim Hyeon. Quanto mais intocável, mais inalcançável, mais ferozmente ela o perseguia.
Mesmo que as memórias viessem à tona como uma represa rompendo, Sonya escolheria Kim Hyeon em vez de Sakhalin. Nada a desviaria.
“Continuar essa operação é desperdício de verba. É melhor se retirar o quanto antes. No setor de construção, um dia de atraso custa dois bilhões de wons. Vamos encerrar logo isso.”
Ela moldou as informações a seu favor, tecendo inúmeras mentiras engenhosas.
No fim, era sempre assim com Lee Wooshin.
Sem perceber, Joo Seolheon havia se tornado exatamente como Damon.