Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 156
Como era de se esperar, Sonya enlouqueceu no instante em que Kim Hyeon desapareceu. Primeiro, tentou desertar para a Coreia do Norte — de alguma forma, percebendo o envolvimento da SNI —, depois se juntou a uma empresa militar privada, recebeu treinamento e chegou a esvaziar as contas bancárias dos parentes do presidente.
Sua intenção de provocar a SNI era clara como o dia. Mas ela jamais poderia se aproximar deles, não importava o que acontecesse. Sonya nunca poderia descobrir a verdadeira identidade de Kim Hyeon — nem a verdade por trás da Operação Caixa de Pássaros.
“Está me ouvindo? Dê uma “liçãozinha” nela.”
Depois de algumas sessões de tortura pesada, Sonya se tornou ainda mais obstinada. Jurou derrubar a vice-diretora da SNI. De quem ela teria herdado tamanha ferocidade? Sua obsessão agora era o próprio laço que a estrangulava.
No fim, foi a própria filha quem a capturou — jogando gás lacrimogêneo em seu rosto e perfurando-lhe a dor até debaixo das unhas, tentando arrancar informações… à procura do marido.
Joo Seolheon jamais pensou que um dia testemunharia algo assim de perto.
Mas o olhar que a fitava diretamente fez seu coração se contrair. Lutando para manter a expressão neutra, ela retribuiu o olhar — ainda mais fria.
Quando Joo Seolheon abriu o arquivo sobre o “Bicho-Papão”, encaminhado por agências de inteligência do mundo todo, seus dedos congelaram sobre o mouse.
Kia. Um padre da Igreja Ortodoxa Russa. Kia, de Sakhalin.
Ele era o principal suspeito pelos assassinatos de agentes e figuras políticas que representavam uma ameaça à Rússia.
Joo Seolheon encarou a expressão impassível de Kia antes de fechar o arquivo. Seu coração latejou, pesado e incômodo.
“Eu tinha esperança de que você levasse uma vida comum. Por que escolheu esse caminho?”
Reprimiu a inquietação, pensando em Sonya.
Alguns dias depois, em uma viagem aos Estados Unidos para uma conferência de inteligência, sentiu o perigo assim que abriu a porta do quarto de hotel. Alguém mexia em um rosário.
“Eu sabia que esse rosto traria problema.”
Um homem, trajando vestes sacerdotais impecáveis, a observava fixamente — sem sequer acender as luzes.
“Por que a vice-diretora da Inteligência Estrangeira estava no Castelo de Inverno?”
“…!”
“A empregada que levou Sonya… era você, não era? Seu nome era Zoya?”
O corpo de Joo Seolheon reagiu antes mesmo de sua mente acompanhar. Ela puxou o revólver da gaveta da escrivaninha.
Ele se lembrava do Castelo de Inverno. Sabia seu nome russo. Só isso bastou para que o sangue lhe fugisse do rosto.
Mas no instante em que ela segurou a arma, Kia chutou a gaveta, esmagando-lhe os dedos.
“Agh!”
Mordendo o lábio, ela o encarou com ódio e incredulidade.
“Por que a hipnose não funcionou em você?” perguntou, ofegante.
“Nunca funcionou.”
“O quê?”
“Sempre foi assim. Eu simplesmente acordei naquele navio.”
“…”
“Os outros esqueceram até os próprios nomes, suas mentes completamente apagadas. Mas eu sabia exatamente o que tinha perdido.”
Um arrepio percorreu-lhe a espinha.
“A hipnose mandava esquecer as memórias infelizes. Mas eu nunca fui infeliz” disse ele, frio.
“…!”
“Por isso, de todos eles, eu sou o único que lembra de tudo.”
O garoto que vira homem soltou uma risada oca.
“Sabe quanto tempo levei para voltar a Sakhalin? Pois agora, você vai pagar.”
Não… Joo Seolheon cerrou os dentes. Não precisava ouvi-lo até o fim. Já sabia o que Kia queria.
Se Kia e Sonya se reencontrassem… um medo terrível tomou conta dela.
Mas então, Kia disse algo inesperado:
“Não é a Sonya que eu quero. É o Kim Hyeon. Me diga quem ele é.”
“…!”
“O marido desaparecido dela.”
Joo Seolheon se enrijeceu, mas logo recompôs o semblante.
“Não é uma ameaça. Mas, se você não cooperar, talvez eu conte tudo à Sonya.”
As sobrancelhas de Kia se contraíram num arco cortante, e ele entortou o rosto num falso ar de tristeza.
“A mãe que deu à luz a ela e depois a jogou naquele inferno… Como pôde fazer isso?”
As palavras cortaram como uma lâmina direto em seu peito. A vergonha, exposta de forma tão brutal, fez seu rosto queimar. Seu sangue gelado fervia. Já não sentia a dor da mão esmagada.
“Eu era o guarda da ala onde Rigay estava trancado” continuou ele. “Mas ele sempre chamava por Zoya, a mulher de cabelos negros. Quando juntei as peças, uma imagem muito estranha começou a se formar.”
“…”
“Fique tranquila. Só eu sei disso por enquanto. Não podemos deixar que outros desgraçados se aproximem da Sonya.”
Nesse momento, a mente de Joo Seolheon girou como uma engrenagem. Fugitivos… fugitivos…
Uma ideia lampejou: ela podia usá-lo para capturar Damon.
“Você sabe que alguns dos irmãos de Sakhalin ainda estão vivos.”
Kia franziu o cenho.
“Mas é perigoso. Para Sonya. Para os seus irmãos.”
“Que truque é esse?”
“Entre os agentes sobreviventes, muitos ainda se lembram de Sakhalin. Alguns ocupam cargos importantes nas agências. Outros se aposentaram, mas foram parar em empresas militares ou no mercado negro de armas.”
“…”
“Se você eliminar todos eles, se não sobrar ninguém que ainda se lembre daquelas crianças…”
“Vai nos dar sua bênção?”
Joo Seolheon fez um acordo perigoso. Assim que voltou à Coreia, juntou-se à Operação Véu Vermelho e entregou as identidades de todos os agentes da CIA que haviam recebido os relatórios de Damon.
A maioria dos agentes vazados provavelmente foi eliminada por Kia. O prazo combinado se aproximava.
“Rigay, você cumpriu sua promessa” murmurou Joo Seolheon, a voz embargada.
O feitiço que havia separado pai e filha — Rigay usara seus próprios olhos para selar as memórias das crianças. A única promessa que pôde fazer por Sonya foi nunca mais vê-la.
Agora, ela ergueu a arma mais uma vez.
“Olhe para mim, Rigay. Este é o rosto da sua filha.”
“A-Ah!”
Quando ele tentou desviar o olhar, aterrorizado, ela arrancou a máscara colada ao pescoço.
“Está tudo bem. Sou eu, Zoya. Rigay, sou eu.”
“Ah! Ugh!”
“Olhe bem. Sonya cresceu linda. Pode olhar o quanto quiser.”
“-Sonya?”
Os dedos trêmulos dele tocaram a máscara falsa moldada ao rosto de Seo-Ryeong, e seus lábios tremeram descontroladamente.
“Você não vai sozinho” sussurrou ela.
“…”
“Eu também envelheci. Também estou cansada. Foi tempo demais… pra você e pra mim.”
“A-Ah… Zoya… eu…”
Os olhos vazios de Rigay vagaram, e ele murmurou para o vazio:
“Eu não consegui salvá-lo… Só ele… o neto do primeiro-ministro…”
“Por nossa culpa… ele se tornou o que é.” pensou Joo Seolheon, lembrando de Lee Wooshin.
“O primeiro-ministro abandonou o neto, Zoya” murmurou Rigay.
“…!”
“Ele fez com que o mundo inteiro olhasse para aquele menino.”
Uma lágrima rolou do olho arruinado de Rigay. Joo Seolheon enxugou-a com a mão trêmula. Então, puxou-o para um último abraço apertado e encostou a arma em sua têmpora.
“Não, Rigay. O jovem Solzhenitsyn cresceu forte. Eu o vi. Frio, mas gentil… e teimoso no amor. Você não acreditaria no homem incrível que ele se tornou.”
“Ah…”
“Essas crianças serão muito diferentes de nós” sussurrou Zoya.
“Espero que sejam” foram as últimas palavras de Rigay.
Pfft! O silenciador estourou contra a têmpora dele. Ela o segurou firme, sufocando os soluços.
Ainda abraçada ao corpo inerte do marido, recarregou o revólver. Preparava-se para pressionar o cano contra a própria têmpora quando…
Bang! Um tiro violento atravessou sua coluna. Mesmo tombando para a frente, ela se recusou a soltar Rigay.
A dor era dilacerante. Sua espinha se partiu num instante. O projétil destruiu seus órgãos e o sangue subiu à garganta. Ao ouvir passos se aproximando, ela levantou os olhos vermelhos para a porta.
“Lá fora está um caos” disse o assassino, entrando no cômodo.
“Você…!”
Kia, vestido com uma batina negra, arrastava o cano da arma ao longo da própria têmpora. Fitou Joo Seolheon — ainda usando o rosto disfarçado de Sonya — com desdém.
Achou mesmo que eu cairia nessa? — dizia seu olhar vazio, enquanto empurrava o corpo de Rigay com o pé.
“O vice-diretor Damon está morto, Zoya.”
“…!”
“O que significa que você é a última que sabe sobre Sakhalin.”
“Ugh!”
“Você é meu alvo final.”
Os últimos registros do Castelo de Inverno iriam para Wooshin. Os documentos confidenciais seriam liberados após sua morte — ela já havia feito o pedido em nome dele.
“Parece que, enfim, tudo está se encaixando, não é?”
“N-Não…”
“Se Sonya me chamar, voltarei para o mosteiro. Nós dois viveremos como antes.”
Como se eu fosse permitir… como se Wooshin deixasse!
Cerrou os dentes, reuniu as últimas forças e puxou o gatilho em direção a Kia. No mesmo instante, a porta se abriu — e os rostos que ela tanto ansiava ver entraram.
No exato momento em que os olhos de Sonya se arregalaram em choque…
Um tiro atravessou o ombro de Kia.
Ah… talvez…
Talvez houvesse… um fio de arrependimento, afinal.
A criança que foi tanto prova quanto ferramenta da inteligência.
Minha única conquista — e minha maior fraqueza.
Minha…
Minha querida… mandei-lhe um buquê de peônias.
Parabéns pelo casamento.
Bang!