Doce Psicose (NOVEL) - Capítulo 157
O disparo que fez os cabelos de Seo-Ryeong arrepiarem a fez sair correndo para fora.
“Chefe Joo Seolheon, o que diabos você tá tentando fazer com o meu rosto?!”
Por mais que pensasse, não conseguia imaginar que fosse por um motivo bom.
Mas seu corpo, ainda fraco por causa do veneno paralisante, cambaleou outra vez, obrigando-a a se apoiar em Wooshin. Assim que entraram no corredor, o antigo distrito da igreja — antes cheio de movimento — estava agora assustadoramente silencioso, como um beco abandonado.
Os seguranças da BLAST haviam sumido. No lugar deles, homens estrangeiros corpulentos e trabalhadores que circulavam pela capela jaziam amontoados no chão, feridos.
A sensação era inegavelmente errada. Entre eles, o guarda que havia lhe entregue os óculos de sol estava caído com uma adaga cravada no pescoço.
“Esse lugar está realmente…” murmurou ela.
Seus passos duros ficaram mais apressados. A cabeça ainda estava um caos, mas precisava ver Rigay de novo — aquele homem — mais uma vez. Só de pensar nisso, ficou inquieta.
O que ele quis dizer com “nossa filha”? Nunca ouvira ninguém chamá-la assim, nunca sequer imaginou algo do tipo. Seo-Ryeong franziu o cenho, profundamente confusa.
“Então é por isso que a SNI me mirou? Porque sou filha do terrorista que derrubou a família do primeiro-ministro russo? Mas o que isso tem a ver com a Coreia?” — pensou, sem perceber que suas unhas cravavam no braço de Wooshin.
Ele falou, firme:
“A BLAST não vai escapar da lei depois disso. Então, a gente confirma o rosto e cai fora, Han Seo-Ryeong. Se você hesitar um segundo que seja, eu te jogo no ombro e te levo.”
“Entendido.”
Ela respondeu obediente — e respirou fundo, se preparando.
“Isso mesmo. Não hesite. Fique alerta. Logo, você vai se casar com esse homem pela segunda vez. E dessa vez é por decisão sua, de mais ninguém. Não estrague tudo.”
Seo-Ryeong apertou a mão dele com calma. Em resposta, Wooshin encostou os lábios nas costas da mão dela, num gesto breve, antes de soltá-la.
Quando abriram a porta, o cheiro acre de algo sinistro preencheu o ar. Um calafrio inexplicável percorreu-lhe a espinha. Ela se desvencilhou de Wooshin e disparou à frente. No instante em que seu corpo instável colidiu contra a pesada porta…
BANG!
Outro disparo congelou tudo. Demorou alguns segundos até sua mente processar a cena diante dela.
Joo Seolheon — com um buraco cravado no meio da testa — fitava Seo-Ryeong, como se um fio invisível as mantivesse conectadas.
Então, as pupilas de Seolheon se dilataram… e, por um instante, os olhos dela se curvaram num leve sorriso.
Era uma expressão que Seo-Ryeong jamais vira antes. O olhar fixo da mulher morta permanecia cravado nela — e, estranhamente, seu coração vacilou.
“O que…”
Um suspiro sufocado escapou enquanto seus ombros tremiam violentamente. Ver um rosto idêntico ao seu morto já seria chocante o bastante — mas agora, o cliente também estava morto.
Rigay Victor. Um buraco de bala na têmpora.
Por quê… por que esses dois?
“Como um terrorista e uma vice-diretora da SNI podem estar se abraçando assim? Eu achei que ela faria de tudo pra me ferrar usando o meu rosto… Desde que acordei naquele caixão, tudo virou um caos.”
Aos poucos, os dois corpos tombaram no chão, os queixos apoiados um sobre o ombro do outro. Seo-Ryeong conteve o tremor no tornozelo e desviou o olhar — para as vestes negras de padre à margem do campo de visão.
“Não entenda errado.” Kia tentou esconder a arma atrás das costas. “Eu não matei o Rigay.”
Ela ficou paralisada enquanto ele empurrava a arma para o lado e se aproximava. Kia não tinha mudado tanto desde a infância — ainda parecia completamente deslocado naquela batina de padre.
O olhar dela se tornou mais afiado.
O mesmo garoto que chorava fácil, pequeno e delicado como uma menina, agora era alto demais, quase absurdo. Ao notar o olhar avaliador dela, Kia apertou os lábios e a observou com uma expressão estranha.
“Han Seo-Ryeong, saia daqui.”
Wooshin a empurrou para trás e sacou o bastão retrátil da cintura. Avançou sobre Kia como um caçador, mirando direto na cabeça.
CRACK! O som seco ecoou quando os dois colidiram como ímãs. Wooshin o pressionou implacavelmente, desferindo golpes rápidos no peito e nas costelas.
Mesmo Kia — que vivia se fazendo de fraco e reclamando nas missões — se movia agora com uma ferocidade assustadora. Ele acertou dois golpes seguidos no maxilar de Wooshin enquanto recarregava a arma.
Mas então, pfft! — um disparo quase silencioso de algum lugar raspou o pulso de Kia.
Wooshin viu o furo no tecido da batina e imediatamente o prendeu pelo ombro, com força de torno. Seguiu com uma sequência brutal de chutes nas costelas inferiores, forçando Kia a tossir violentamente.
Qualquer pessoa normal teria desabado em posição fetal depois disso — mas Kia aguentou como se não fosse nada. Wooshin rangeu os dentes diante daquela resistência absurda.
“Achou mesmo que ia sair ileso “depois de ser pego em flagrante?”
Ele puxou um canivete e o cravou no ombro de Kia, torcendo o braço dele.
“Ainda não terminou?”
Kia sorriu — os dentes manchados de sangue. À primeira vista parecia deboche, mas Seo-Ryeong entendeu o que estava por trás.
“Ainda não encontraram Kim Hyeon, né?” disse ela, hesitando, abaixando a arma que havia pegado de Joo Seolheon.
“Eu não sou o vilão aqui” murmurou Kia, encostado na parede, com a voz arrastada. “Só fiz o que a vice-diretora mandou.”
“…”
“Qual o problema de cumprir uma promessa? Eu não fiz nada errado.”
Seo-Ryeong olhou para os dois corpos caídos no chão. O olhar era distante, como se observasse estranhos — mas não conseguia desviar os olhos.
Um homem, mutilado além do reconhecimento. Uma executiva da SNI, roubando o rosto de outra pessoa, agora abraçando um criminoso. Era a própria desonra personificada.
Mesmo assim, como que hipnotizada, ela se ajoelhou e fechou os olhos de Joo Seolheon. Em seguida, arrancou com força a máscara colada ao rosto da mulher.
Por um momento, ficou olhando o rosto verdadeiro de Seolheon — estranhamente sereno — antes de desviar o olhar, fria.
“Instrutor, chega. Vamos embora. Agora.”
Seo-Ryeong amassou a máscara roubada entre os dedos, como argila, a voz carregada de urgência. A simples ideia de deixar qualquer traço seu naquela cena lhe causava repulsa.
Ela hesitou por um instante sobre o que fazer com a arma de Seolheon, mas acabou enfiando-a no cós da calça. Não havia tempo para limpar impressões — cada segundo era precioso.
Foi então que a porta se escancarou. Homens de terno preto invadiram, cercando o local.
“…!”
Ela não conseguiu entender quem eram, mas assim que seus olhares se cruzaram, eles a agarraram sem hesitar, arrastando-a para fora.
“Você é Han Seo-Ryeong?”
“Me solta!”
Mas os braços que a seguravam eram de ferro.
“Foi emitido um mandado de prisão contra a equipe especial da BLAST, incluindo o CEO Kang Taegon. As acusações vão desde violação da Lei de Segurança Nacional até suborno, lobby ilegal e crimes internacionais — dezenas de casos. Você trabalhou para cartéis, para a Rússia, e para ditaduras, não foi?”
“…”
“Nós cuidaremos da cena. Não deixe o Ministério Público te pegar; saia daqui antes que a polícia cerque o prédio. Essa foi a última ordem da vice-diretora.”
As palavras mal chegaram a fazer sentido.
Ela se virou para Wooshin — ele estava na mesma situação, sendo contido por outros homens, que falavam rápido, tentando parecer educados, mas transbordando urgência.
O olhar dele se endureceu ao lançar um último olhar para o corpo de Joo Seolheon.
Seo-Ryeong ficou imóvel, atordoada, mas Wooshin, já recomposto, atravessou os homens e a alcançou, o cenho franzido.
“Vocês ouviram. Soltem ela. Agora.”
Ele afastou as mãos que a seguravam e puxou Seo-Ryeong para seus braços. Ela deixou que ele a conduzisse para fora — mas o olhar ainda voltava, uma e outra vez: primeiro para Rigay, depois para Joo Seolheon… e então…
Um grupo tático cercava Kia, imobilizando-o como a um criminoso. Mesmo com o rosto pressionado contra o chão, ele ria — baixo, zombeteiro.
Não era uma luta desesperada pela sobrevivência, como antigamente. Ver aquele comportamento quase casual a enojou.
“Quantos anos você tem agora, e ainda se deixa arrastar assim?”
Observando Kia ser algemado, os braços torcidos para trás pelos agentes, o estômago de Seo-Ryeong se revirou — e ela não sabia dizer por quê.
Inconscientemente, juntou os lábios e soltou um assobio agudo.
Se fosse o Kia… ele entenderia.
Ele tinha que entender. Já haviam se comunicado assim centenas, milhares de vezes — fugindo de ursos, pulando de janelas, girando nos braços um do outro com sinais que só eles compreendiam.
E, como esperado, os olhos dele se arregalaram e a buscaram. A expressão rígida se desfez, como se tivesse sentido o perfume de Sonya — e por um breve instante, seus olhos brilharam.
Uma única lágrima caiu.
“Corra. E me siga.”
Foi isso que o assobio quis dizer.