Tente Implorar (Novel) - Capítulo 13
— Devia ter deixado você atirar?
Leon guardou o revólver na gaveta e a fechou. Não trancou.
Roubar seria um pecado um pouco maior. Desobedecer ao patrão, no entanto, podia ser considerado crime grave dentro daquelas paredes. Seria esse o pretexto para arrastá-la até a câmara de tortura?
Com esse pensamento, ele torceu os lábios num sorriso torto e estreitou os olhos.
As manchas de sangue já começavam a desbotar, mas ainda estavam ali.
Talvez não fossem os olhos… talvez fosse o cheiro do sangue. Será que, mesmo se fosse outra mulher, ele teria esse mesmo desejo se ela tivesse o mesmo perfume metálico…?
Era um gosto digno do inferno.
Ele sorriu, amargo, e se levantou. O carpete estava coberto por cacos e cinzas do cinzeiro quebrado. Amanhã cedo, a criada viria limpar a bagunça, resmungando baixinho contra ele.
Leon desenrolou um “recado de incentivo” — uma nota de dinheiro — para a empregada e o largou no chão.
[ … ]
O sol brilhava suavemente por entre nuvens de lã. Seus cabelos castanhos escuros dançavam ao vento, reluzindo na luz que se quebrava no ar.
Era um dia perfeito para sair.
O clima em abril era tão instável quanto o humor dos Winston — e Sally jamais sabia o tipo de capricho que o céu traria. A cidade mais próxima, Halewood, ficava a dez minutos de bicicleta da Mansão Winston.
Sally estacionou a bicicleta em frente a um prédio de tijolos de três andares, logo após a loja de variedades com uma enorme placa de desconto. Chegou bem quando o intervalo do almoço terminava, cruzando com o gerente dos correios enquanto ele virava a placa de “fechado” para “aberto” na janela. Um homem de meia-idade levantou os óculos com o dedo indicador e lançou-lhe um olhar breve antes de abrir a porta.
— Boa tarde, senhorita Bristol.
— Boa tarde.
Sally estacou assim que cruzou a entrada.
A agência dos correios da pequena cidade contava com quatro funcionários, incluindo o diretor. Mas naquele dia, por algum motivo, havia apenas três.
— O senhor Peter tirou folga hoje?
— O trem dos correios se atrasou. Ele está na estação.
Peter passava o dia todo no vilarejo disfarçado de carteiro, mas costumava almoçar ali. Por isso, Sally viera justamente naquele horário — mas, ao que tudo indicava, sem sucesso.
Trouxera o dinheiro que arrancara de Winston no dia anterior para enviar ao quartel-general, como verba da resistência. Sempre confiava a remessa a Peter, que conseguia torná-la impossível de rastrear. Com os outros funcionários, até mesmo informações disfarçadas poderiam ser arriscadas.
— Se esperar um pouco, ele logo chega, haha.
Sally suspirou, apertando as alças de sua velha bolsa. O diretor sorriu, alisando o longo bigode com a ponta dos dedos. Os funcionários dos correios achavam que Sally tinha uma quedinha por Peter.
…Como se fosse possível.
Mesmo se sua postura fosse recatada por dever de ofício, seus olhos para os homens sabiam ser frios e precisos.
‘Vamos matar tempo, então?’
Duas portas adiante, havia o Café Madame Benoa. Já fazia algum tempo que pensava em se dar um pequeno luxo.
Uma mulher de meia-idade surgiu arrastando três crianças para dentro da apertada agência. Logo, o espaço foi tomado por vozes infantis e gritos impacientes. Sally pensou em sair, mas decidiu entrar na cabine telefônica num canto.
Fechou bem a porta e espiou pela janelinha. Todos estavam ocupados demais para lhe prestar atenção. Sentou-se meio torta sobre a cadeira e, de dentro da bolsa, encontrou sua carteira.
Não pegou só uma, nem duas — mas três das moedas mais pesadas.
Suspirou quando foi buscar a quarta. Sally raramente fazia chamadas de longa distância; custava caro demais. Mas, naquele caso, não tinha alternativa.
Ergueu o fone — que parecia a base de um castiçal — até o ouvido e colocou as moedas na abertura. Assim que girou um dos discos, a voz aguda de uma jovem ecoou:
[ Esta é uma ligação interurbana. ]
— Alô. Aqui é Blackburn de Halewood.
Sally se inclinou na direção do microfone.
— Crawford 1499, em Brayton, por favor.
Em seguida, informou o bairro e o nome da companhia telefônica do outro lado da linha.
[ Um momento, por favor. ]
Depois disso, o que se ouviu foram apenas cliques mecânicos, que pareciam ecoar sem fim.
Enquanto aguardava, Sally espiou para fora da cabine, inquieta.
A mulher com as crianças agora batia papo com a atendente, como se não tivesse intenção de sair tão cedo. Sally esperava que continuasse assim pelos próximos dez minutos.
‘É por isso que vale a pena chutá-la.’
Passou quase uma hora ali, lutando contra o zumbido das vozes do lado de fora, mas não ouvia o que mais importava. Alisava, distraída, a alça gasta da bolsa quando a porta da agência se abriu.
Ergueu os olhos, achando que fosse Peter — mas, ao invés disso, uma voz familiar saiu do telefone:
[ Blackburn de Halewood? ]
Sem perguntar quem era, seu noivo recitou o código para pedidos de retirada.
— Exato.
[ …O quê? Você? ]
Ele parecia surpreso. Esperava ouvir a voz de Peter ou de Fred, não dela.
[ O que houve? ]
Nada de saudações — apenas foi direto ao ponto. A telefonista ainda podia estar escutando, então a conversa continuou sem nomes.
— Quero voltar pra casa.
Jimmy entenderia. Conhecia bem aquele tom sarcástico: era apenas fachada. Sally jamais agia como uma criança.
[ E as contas do hospital da mamãe? ]
‘Contas do hospital’ era o código para ‘sua missão’.
— O patrão é esquisito.
[ Esquisito como? ]
— Você se esqueceu do que te disse antes de eu vir pra cá?
Não podia ter esquecido: ela o alertara que Winston poderia reconhecê-la por causa de um antigo encontro na Praia de Abbington.
Do outro lado da linha, ouviu-se um suspiro longo.
[ Mas você ainda não foi cortada. ]
Ou seja, ainda não fora descartada — nem presa.
— Talvez esteja perto de ser.
[ Não. Você é boa. E ele não tem provas, certo? ]
Sally soltou um suspiro pesado no microfone.
[ Eu preciso de você. ]
Jimmy sabia muito bem qual era a fraqueza da noiva. Cresceram juntos — para ele, ela era como uma irmã.
— Mesmo assim…
Ela respirou fundo, hesitou… e, enfim, disse o que não queria contar — muito menos a ele.
— Ontem, ele tentou me atacar.
Silêncio.
Que pensamentos estariam passando pela cabeça dele, a cinco horas dali, por trem?
Preocupação com a mulher que quase foi violentada? Desejo de tirá-la dali imediatamente? Ódio pelo bastardo que ousou tocá-la?
…Ou decepção com a camarada que colocou a missão em risco por parecer fraca aos olhos do inimigo?
[ É sério? ]
Tudo errado. Sally explodiu.
— Você acha que eu mentiria sobre isso?
[ Não, não foi isso que eu quis dizer. Só… não combina com o que eu sei dele. ]
Jimmy conhecia bem Winston. Mesmo sendo um canalha, tinha fama de manter o corpo limpo — sem escândalos sexuais. Por isso, achou seguro mandar sua noiva para o covil do inimigo.
Aquela era a primeira vez que Sally relatava algo fora desse padrão. Era difícil de acreditar.
Então ela apertou mais um pouco, para que ele entendesse a gravidade.
— Perdi o que estava escondendo sob a saia.
[ …E mesmo assim, não foi cortada? ]
— Justamente por isso é mais perigoso.
Winston a tratava diferente. E isso a deixava vulnerável.
Sally esperou em silêncio.
Deveria dizer mais? Falar que Winston, depois de sugar o sangue de seu ferimento, havia deixado no chão da sala uma prova do próprio prazer — um lenço sujo de sangue?
Mesmo sendo seu noivo, Jimmy era como família… e aquilo era humilhante demais para se confessar.
— Não tenho muito tempo.
As moedas estavam acabando.
Do outro lado, um suspiro pesado. E então, a ordem, dita num tom que apenas quem a conhecia bem usaria:
[ Vou pra casa de um amigo. Vou falar com uns adultos e te ligo. ]
Ou seja: conversaria com os chefes. E ela devia esperá-lo em Winsford, um ponto de apoio a uma hora dali, de bonde.
Sally desligou imediatamente e saiu da cabine.
Talvez seja melhor mandar o dinheiro depois… Peter ainda não havia voltado.
No fim, apenas cumprimentou o diretor dos correios e deixou o prédio.
→﹐ ⛩ ﹒ 𝒌ırα﹒⟢
Esse noivo não me desce desde o começo.